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sábado, 24 de março de 2018

Notícia - Vamos clonar neandertais?

A publicação do primeiro esboço do genoma neandertal reacendeu o debate sobre a hipótese de clonar o nosso parente extinto. As enormes complexidades de carácter técnico, ético e jurídico do processo dividem os especialistas.

Se os neandertais voltassem a pisar a Terra, o barro primordial do qual surgiriam seria uma emulsão de óleo, água e ADN sintetizado no laboratório da empresa 454 Life Sciences (­www.454.com). Com efeito, nos últimos quatro anos, os funcionários da companhia biotecnológica sediada em Branford, no Connecticut, dedicaram-se a reunir material genético proveniente de diversos vestígios orgânicos, incluindo fragmentos de osso. A tarefa revelou-se fundamental para se poder delinear o primeiro esboço do genoma do Homo neanderthalensis, cujas conclusões foram publicadas, em Maio, na revista Science. Notícia explosiva: confirma-se que houve acasalamento entre o Homo sapiens e o seu antecessor mais próximo, como sustentaram João Zilhão e Erik Trinkhaus.

Embora a confirmação desse cruzamento pré-histórico tenha merecido uma posição de destaque nas primeiras páginas dos jornais, os cientistas estão interessados em ir mais longe; querem conhecer a fundo a biologia dos neandertais, em especial o que os distingue de nós. Ora a forma mais directa de obter informação seria clonar exemplares inteiros, como acontece com os dinossauros de Parque Jurássico. Seria possível em termos técnicos? E, no caso de conseguirmos, teríamos o direito de trazê-los de volta ao mundo? Como poderiam encaixar-se numa sociedade humana moderna?

Nas instalações da 454 Life Sciences, Gerald Irzyk, Jason Affourtit e Thomas Jarvie explicam-nos os busílis do seu trabalho. No começo, os estudos genéticos dos neandertais concentravam-se apenas nas mitocôndrias, organitos que transformam os nutrientes em energia no interior das células. Porém, em 2005, a 454 iniciou um projecto multidisciplinar em colaboração com o Instituto Max Planck de Leipzig, na Alemanha, que iria ampliar definitivamente o campo de acção dos cientistas. O objectivo é obter a sequência completa do material genético de uma fêmea morta, há 30 mil anos, numa caverna croata de Vindija.

A companhia do Connecticut desenvolveu um método para decifrar centenas de milhares de sequências de ADN em simultâneo. Segundo Jarvie, a tecnologia avança a uma velocidade comparável à potência de processamento dos computadores. “Há seis anos, descodificar o genoma da bactéria E. coli, que conta aproximadamente quatro milhões de pares de bases, teria custado entre um e dois milhões de dólares e exigido a dedicação de 150 pessoas durante um ano”, explica. “Agora, uma única pessoa consegue fazê-lo em dois dias por algumas centenas de dólares.”

Contudo, há um factor que aumenta a dificuldade da tarefa quando os investigadores têm de lidar com espécies já extintas: a degradação do material genético. Com efeito, poucas horas após a morte, as células começam a decompor-se, num processo denominado “apoptose”, e a libertar enzimas que dividem o ADN em diminutos fragmentos. Depois, o ácido desoxirribonucleico sofre alterações químicas que podem induzir interpretações incorrectas da sequência genética. No caso da amostra neandertal, entre 90 e 99 por cento do ADN provém de bactérias e outros elementos alheios que penetraram nos restos ósseos à medida que estes iam ficando soterrados. Devido à semelhança entre o genoma neandertal e o dos humanos modernos, o problema poderá revelar-se especialmente grave se a contaminação for proveniente de pessoas que escavaram ou analisaram o osso.

Clonar um neandertal será ainda mais trabalhoso do que reconstituir o seu genoma. A tecnologia de que dispomos permite reproduzir artificialmente uma cópia exacta da sequência de ADN de forma rápida e barata, mas um filamento de ácido desoxirribonucleico a flutuar livremente não tem muito valor para dar vida a uma célula. “Como empacotar os genes em cromossomas para os introduzir num núcleo? Não sabemos fazê-lo”, admite James Noonan, geneticista da Universidade de Yale.

A forma adoptada pelo ADN dentro dos cromossomas condiciona o modo como os genes interagem com os compostos químicos do interior da célula. Como essas interacções controlam a produção de proteínas, os tijolos do organismo, a expressão do genoma é tão importante como o próprio ADN. Segundo Carles Lalueza-Fox, paleogeneticista da Universidade de Barcelona, os danos celulares que ocorrem após a morte impedem-nos de conhecer como se produz exactamente o complexo processo bioquímico. Obter um clone idêntico de alguém que viveu há 30 mil anos seria, deste ponto de vista, uma impossibilidade.

Outra forma de abordar o problema consistiria em alterar o ADN de uma célula viva, um tipo de bioengenharia que já é exequível, embora apenas se possa efectuar poucas modificações. George Church, professor da Escola de Medicina de Harvard (Estados Unidos), faz parte de uma equipa de investigação que pretende produzir centenas de alterações através de uma técnica denominada “engenharia genómica automatizada em multiplex” (MAGE, na sigla inglesa). Os especialistas de Harvard utilizam fibras de ADN muito curtas, denominadas “oligonucleótidos”, para inserir material genético em locais específicos. O MAGE já permitiu produzir 24 alterações nos genomas de bactérias, ratos e células humanas. Trata-se de um primeiro passo encorajador, mais ainda bastante tímido: Church estima que seriam necessárias cerca de dez milhões de modificações para conseguir que um genoma humano moderno coincidisse com o do homem do Nean­dertal.

O investigador considera que a clonagem deveria partir de um nível básico; as células de órgãos como o fígado, o pâncreas ou o cérebro. “Não se deduz nada se nos limitarmos, simplesmente, a observar a sequência genética. É difícil prever os caracteres físicos; é preciso comprová-los em células vivas”, explica. A investigação médica poderia beneficiar do feito: se os neandertais fossem suficientemente diferentes da nossa espécie, as suas células seriam geneticamente imunes a doenças humanas como a sida ou a poliomielite. As diferenças biológicas também poderiam contribuir para o desenvolvimento de novos fármacos ou tratamentos genéticos.

Até agora, os esforços para ressuscitar espécies extintas através da clonagem têm tido resultados frustrantes. A 6 de Janeiro de 2000, uma violenta tempestade no Parque Nacional de Ordesa, em Espanha, derrubou o ramo de uma árvore que pôs fim à vida de Celia. Tratava-se do último exemplar de Capra pyrenaica pyrenaica, uma subespécie de cabra montês. Em 2003, uma equipa de investigadores tentou ressuscitar a estirpe de Celia a partir de uma amostra de tecido proveniente da orelha do animal, congelada quando ele ainda estava vivo. Conseguiram, dessa forma, implantar 57 embriões da subespécie no útero de várias cabras montesas: 52 não sobreviveram ao período de gestação, quatro nasceram mortos e a única cria sobrevivente morreu dez minutos depois de ter nascido, devido a uma deficiência pulmonar. A fim de criar os clones de Celia, os cientistas espanhóis ugtilizaram métodos desenvolvidos pela Advanced Cell Technology (ACT), uma companhia biotecnológica com sede em Worcester, no Massachusetts. A técnica, denominada “transferência nuclear”, consiste em extrair o núcleo de uma célula proveniente de uma espécie com a qual possui um estreito parentesco e substituí-lo por outro com o ADN clonado. No caso da cabra montesa, foram utilizados óvulos de cabra doméstica. De acordo com Robert Lanza, director científico da ACT, já foram efectuadas clonagens de gado bovino, ovino e caprino de forma rotineira com recurso a esta técnica.

No entanto, as espécies que não são habitualmente “fotocopiadas” têm de enfrentar sérios riscos, pois o processo de transferência nuclear provoca, frequentemente, a morte da célula. É por isso que praticamente toda a comunidade científica se opõe a qualquer experiência com a nossa própria espécie. Mesmo que se conseguisse aperfeiçoar o método, iria exigir, provavelmente, um terrível período de tentativa e erro.

Porém, existe outra opção: fabricar células estaminais com o ADN dos neandertais. Nos últimos anos, os geneticistas aprenderam a obter células da pele para fazê-las regressar ao denominado “estado pluripotencial”, no qual podem integrar qualquer elemento do corpo humano. George Church sugere utilizar a técnica MAGE para alterar o ADN de uma das stem cells, de modo a fazê-la coincidir com o genoma neandertal. Dessa forma, seria possível cultivar colónias de células do coração, do cérebro ou do fígado, órgãos e, em última instância, organismos inteiros. O processo para ressuscitar um ser do passado consistiria, fundamentalmente, em implantar a célula estaminal com o ADN neandertal num blastocisto (fase inicial do embrião) humano. Church considera que, após as primeiras etapas de desenvolvimento, os genes se exprimiriam tal como o fariam no indivíduo primordial, eliminando qualquer influência do Homo sapiens.

Até agora, a técnica foi apenas experimentada em ratos, mas Church pensa que poderia funcionar em hominídeos. Contudo, adverte que esta clonagem nunca poderia abranger os factores culturais e ambientais que influenciavam o crescimento dos verdadeiros neandertais. “Seriam neo-neandertais”, define.

O Homo neanderthalensis separou-se da linhagem dos seres humanos modernos há cerca de 450 mil anos. Desenvolveu um cérebro maior e uma estatura inferior à do seu presumível antecessor, o Homo heildelbergensis. Criou igualmente uma grande variedade de ferramentas de pedra, assim como técnicas mais eficientes para fabricá-las. Possuíam, em média, encefálos 100 centímetros cúbicos maiores do que os dos actuais humanos, o que poderá ser explicado pela diferença na constituição física. Exibiam crânios largos e achatados, uma testa mais baixa do que a nossa e um rosto sem queixo.

Por outro lado, os ossos grossos e fortes costumam exibir marcas de fracturas, pois as técnicas cinegéticas que utilizavam obrigavam-nos a aproximar-se demasiado das grandes presas, como é o caso dos bisontes ou dos mamutes. Possuíam grandes caixas torácicas em forma de barril e narizes proeminentes, características que talvez os ajudassem a respirar quando caçavam a temperaturas muito baixas, segundo conjecturam alguns paleoantropólogos.

Estudos recentes proporcionaram perspectivas surpreendentes. “Não são simplesmente uma espécie de esquimós pitorescos que viveram há 60 mil anos”, diz Jean-Jacques Hublin, paleoantropólogo do Instituto Max Planck. “Tinham outra maneira de dar à luz e diferenças fisiológicas, na forma do ouvido interno ou na idade de desmame e da puberdade.” Um estudo demonstrou que os neandertais tinham uma infância abreviada: alguns estudiosos pensam que atingiam a maturidade física aos 15 anos.

Seja como for, há quem ache que eles não eram suficientemente estranhos para se poder considerar que pertenciam a outra espécie. “Actualmente, há seres humanos que apresentam fenótipos [conjuntos de características físicas] ainda mais distintos entre si”, argumenta John Hawks, paleoantropólogo da Universidade do Wisconsin. Hawks estudou o ADN de populações modernas para com­preen­der a taxa de alteração evolutiva no Homo sapiens. Muitas das diferenças dever-se-iam a transformações genéticas que a nossa estirpe teria sofrido a partir da extinção dos neandertais, há 30 mil anos.

“Desde então, contabilizámos entre 2500 e 3000 acontecimentos que desencadearam modificações favoráveis no genoma humano”, recorda Hawks. Somos tão diferentes dos povos neolíticos que viveram há dez mil anos como estes o teriam sido dos neandertais. Em concreto, os clones de Homo neanderthalensis manifestariam intolerância à lactose, dificuldade em metabolizar o álcool, propensão para desenvolver a doença de Alzheimer e ausência de imunidade a outras infecções. Mais importante do que tudo, é o facto de contarem com cérebros distintos do do homem moderno.

Todavia, não convém subestimar aquelas mentes, capazes de impressionantes inovações culturais. Já enterravam os mortos há 110 mil anos, o que significa que o seu sistema social exigia a inumação formal dos falecidos. Além disso, há cerca de 40 mil anos, adoptaram novas técnicas para fabricar ferramentas: a tradição uluzziense, em Itália, e a chatelperronense em toda a Europa Ocidental. Nesse caso, se eram tão versáteis como o Homo sapiens, por que motivo se extinguiram? Chris Stringer, do Museu de História Natural de Londres, considera que a nossa espécie caçava e recolhia alimentos de forma tão intensiva que já não havia, simplesmente, espaço para os ­neandertais procurarem sustento. Por outras palavras, foram expulsos do seu nicho ecológico, tal como está a acontecer com muitos animais nos nossos dias.

Bernard Rollin, professor de filosofia na Universidade do Estado do Colorado, não pensa que a criação de um clone neandertal venha colocar um conflito ético por si só. O problema reside na forma como esse indivíduo seria tratado. “Não seria adequado colocar alguém numa situação em que possa sentir-se ridículo e, provavelmente, provocar-lhe medo”, afirma. “Devemos também considerar que não se poderá relacionar com pessoas como ele. E isso, dado que os seres humanos são seres sociais, seria extremamente injusto.” Stringer é da mesma opinião: “Iríamos colocá-lo num mundo a que não pertence.” Quando os nean­der­tais desapareceram, ainda não existiam cidades. No seu apogeu demográfico, talvez atingissem os dez mil indivíduos, dispersos por toda a Europa. O nosso clone talvez não possuísse as adaptações biológicas necessárias, quaisquer que elas sejam, para poder enfrentar uma maior densidade populacional.

Todavia, nem todos consideram que seriam diferentes ao ponto de serem automaticamente marginalizados: “Estou convencido de que um neandertal, se fosse criado no seio de uma família humana moderna, se comportaria como qualquer pessoa”, afirma Trenton Holliday, paleoantropólogo da Universidade de Tulane, em Nova Orleães. “Poderia falar e fazer tudo o que fazemos.”

“Acho que não se hesitaria em atribuir a esse indivíduo os direitos humanos consagrados nas constituições e nos tratados internacionais”, afirma Lori Andrews, professora da Faculdade de Direito Chicago-Kent. Não existe uma definição jurídica sobre o que é uma pessoa, embora haja discussões entre os académicos sobre situações que envolvem engenharia genética. “Este seria um caso de modificação de uma espécie. Iria mudar, por conseguinte, a forma como surge uma nova geração”, reflecte Andrews. Até que ponto se teria de alterar o nosso genoma para que um indivíduo criado a partir dele deixasse de ser considerado humano?

Nos Estados Unidos, a jurisprudência parece estar do lado dos direitos dos neandertais. Em 1997, Stuart Newman, professor de biologia da Escola de Medicina de Nova Iorque, procurou obter uma patente para o genoma de um híbrido de chimpanzé e ser humano com o objectivo de evitar que alguém se lembrasse de criar semelhante ser. Todavia, o departamento de patentes rejeitou o pedido, argumentando que violaria a 13.ª emenda da Constituição norte-americana, que proibe a escravatura: a decisão implica que a criatura seria protegida pelos direitos humanos, tal como aconteceria, com maior razão ainda, no caso de um neandertal.

Lori Andrews chega a uma simples conclusão: “Se beneficiasse de protecção jurídica, poderia invocar o direito de não querer ser alvo de investigação, pelo que o próprio motivo para a sua criação se tornaria uma privação dos respectivos direitos.” Isso para não falar da própria legitimidade da clonagem humana (teoricamente proibida em alguns países e autorizada noutros), ou na delicada questão das patentes comerciais dos genes.

Seja como for, a oportunidade de observar um neandertal vivo parece, à partida, demasiado sedutora para ser ignorada. A questão é saber se o que aprenderíamos, para além de satisfazer a nossa curiosidade, seria mais importante do que o nosso sentido de compaixão. Haveria suficientes vantagens científicas para correr todos os riscos? “Claro que gostaria de ter um neandertal clonado diante dos olhos, mas entre o meu desejo de vê-lo e a escassa informação que obteríamos, não creio que valesse a pena”, opina o paleoantropólogo Trenton Holliday. Outro colega, Jean-Jacques Hublin, é ainda mais duro: “Não somos doutores Frankenstein que manipulam genes humanos apenas para ver como funcionam.” O geneticista James Noonan está de acordo: “Se a experiência se revelar um êxito e conseguir criar um neandertal que fale, violou-se todas as normas éticas. No caso de fracassar... perde-se em qualquer dos casos.”

Outros especialistas argumentam que podem existir circunstâncias que justifiquem a clonagem. “Se pudéssemos, realmente, consegui-lo e soubéssemos que estávamos a fazê-lo bem, então sou a favor”, indica Bruce Lahn, geneticista da Universidade de Chicago. “De qualquer modo, não pretendo minimizar o problema do indivíduo viver num meio onde talvez não se consiga encaixar. Se também pudéssemos proporcionar-lhe um habitat e ressuscitar um punhado de companheiros, as coisas seriam diferentes.”

“Podemos aprender muito mais com um nean­dertal adulto vivo do que através de culturas celulares”, diz Church. “No entanto, seria necessário estipular acordos para estabelecer um lugar ele pudesse viver como quisesse”, acrescenta. O clone também deveria poder contar com um grupo social, o que implica criar congéneres, uma colónia inteira. Na opinião de Church, estudar esses neandertais, com o seu consentimento, abriria a possibilidade de curar doenças e salvar vidas. Além disso, os cérebros conformados de forma distinta poderiam proporcionar diferentes perspectivas para a resolução de um problema. É também possível que expandissem a diversidade genética humana, contribuindo para proteger o nosso género de uma futura extinção. “Dizer simplesmente não, não fazer nada, é uma decisão muito arriscada”, resume.

John Hawks acha que vão cair as barreiras que impedem a clonagem do nosso parente. “Temos a intenção de ressuscitar o mamute. A oposição a fazermos o mesmo com um neandertal também irá dissipar-se com o tempo.” Não considera que seja um comportamento científico ético, mas recorda que há sempre pessoas dispostas a infringir as normas. “Ainda vamos ver um neandertal clonado; estou convencido disso”, vaticina.


Pálidos e ruivos
Há 49 mil anos, foram assassinados onze neandertais nas Astúrias (Espanha). A superfície dos ossos mostrava cortes, indício de que tinham sido descarnados com utensílios de pedra. A cerca de 200 metros, no interior da caverna de El Sidron, uma equipa de investigadores que incluía Carles Lalueza-Fox, da Universidade de Barcelona, recuperou 1700 restos ósseos do festim canibal. Grande parte do que se conhece da genética neandertal provém desses vestígios.

Lalueza-Fox não pensa sequenciar o genoma inteiro dos indivíduos encontrados em El Sidrón. “Apenas escolho os genes que estejam, de algum modo, relacionados com a personalidade”, explica. Até agora, o seu trabalho mostrou que possuem uma variante única do gene responsável pela pele pálida e pelo cabelo avermelhado. Neste aspecto, eram diferentes dos seres humanos.

O paleogeneticista analisou também os grupos sanguíneos de dois neandertais e descobriu que eram ambos de tipo O. Verificou, igualmente, que partilham com a nossa espécie uma variante do gene FOXP2, relacionada com a capacidade de aquisição de linguagem. Isso sugere que os chacinados de EL Sidron falavam, provavelmente, a sua própria língua.



A voz dos genes
Os genomas humano e neandertal são idênticos em 99,84%. Exemplos dos poucos genes que nos distinguem.

RPTN. Fabrica a proteína repetina (pele, glândulas sudoríferas, raiz do cabelo e papilas gustativas).

TRPMI. Relacionado com a melastatina, que intervém na pigmentação da pele.

SPAG17. Relacionado com o movimento dos espermatozóides.

THADA. Diabetes de tipo 2.

DYRK1A. Síndroma de Down.

AUTS2. Desenvolvimento neuronal (relacionado com o autismo?).

ACCN1 e CADP2. Autismo?

NRG3. Esquizofrenia?

RUNX2 (CBFA1). Displasia cleidocraniana (malformações no crânio, na caixa torácica, nas clavículas e na dentição).



Mestiçagens no Paleolítico

Quando o Homo sapiens começou a abandonar África, há 80 mil a 50 mil anos, a nossa espécie manteve contacto carnal e procriou, durante um breve período, com o Homo neanderthalensis. É esta a conclusão mais interessante do primeiro esboço do genoma neandertal, elaborado por uma equipa internacional de investigadores sob a direcção do biólogo sueco Svante Pääbo. A hibridação, finalmente comprovada após anos de controvérsia que teve o seu epicentro no “menino do Lapedo”, o esqueleto descoberto perto de Leiria, teve como consequência o facto de entre um e quatro por cento dos genes dos humanos modernos serem provenientes do hominídeo extinto.

O intercâmbio terá provavelmente ocorrido no Médio Oriente, antes de a humanidade se dispersar pela Europa e pela Ásia. A hipótese baseia-se no facto de o genoma dos actuais africanos não conter vestígios do cruzamento. De acordo com Pääbo, “poderemos, pela primeira vez, identificar características genéticas que nos diferenciam dos restantes organismos, incluindo os nossos parentes evolutivos mais próximos”. A sequenciação, que já inclui 60% do ADN neandertal, tem sido comparada com os genomas de um chimpanzé e de cinco pessoas provenientes de África, China, França e Papuásia-Nova Guiné.

SuperInteressante 
Z.Z.

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